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O enigma de Daniela
Em até 4 de 24.50 s/juros
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A retirada de um tumor do cérebro de uma mulher se embaraça, nesta narrativa, como criminoso desastre de automóvel sofrido por outra: “águas me cercaram até a alma, o abismo me rodeou, e as algas se enrolaram na minha cabeça”. É como se, pelos hábeis dedos do neurocirurgião (que alinhavam o fio de acaso entre ambas), suas histórias se enredassem, se enovelassem, a ponto de compor este “romance de vidas”, essas 36 “Linhas” que as costuram.
Enquanto a segunda mulher (vítima de lesão medular) perde a mobilidade, a outra (recuperada, com a potência do seu sopro vital) lhe cede à voz, e, com ambas as mãos, juntas, constroem a muralha da sua resistência e do seu alerta ao mundo.
Mas não suponha o leitor que este é um livro de autoajuda. Ao contrário, trata-se de um volume que pede ajuda!
E é de tudo que o romance se compõe: de pedras, pedacinhos, retalhos, atalhos, desenhos de todos os tipos – pedregulhos. É um Muro de Lamentações onde, em cada interstício entre as palavras, um a um dos componentes desse enredado acontecimento enfia (esconde?) o seu minúsculo papel, a sua mensagem, o seu recado, o seu pedido, a sua prece: o seu enigma. Todos interligados (amarrados entre si como num “cipó de floresta amazônica”) no mesmo Shoah.
Daí o hibridismo desta obra, composta por toda a sorte de contribuições ficcionais, que pedem auxílio e apelam para que sejam preenchidas com o que o leitor puder lhes achegar com o cimento da sua experiência. São narrativas de lendas, de cenas dolorosas; diálogos internalizados, matéria jornalística, relatórios; improvisações jazzísticas, poemas; entrevistas, suposições, depoimentos; notas ao pé da página, filosofia, história, crítica social, psicanálise, literatura; religião. Misticismo em todos os sentidos.
E o mérito que ela vai ganhando não é só porque nos põe direto em contato com a inaudita e inimaginável dimensão do que cabe aos tetraplégicos, daquilo que lhes antecipou a tragédia ou que lhes sobreveio a tal infortúnio – e isso não é possível medir em éfas. É que, por meio da magia de tal miscigenação literária, do envolvimento íntimo com o leitor, a escrita de Lelita Benoit expõe uma evidência de difícil deglutição. Que nada ou ninguém neste nosso território – muito menos alguma instituição (seja a Medicina, a Educação, os Seguros Sociais, a Justiça, o Trabalho – e, sobretudo, a consciência discriminadora das pessoas) está minimamente preparado para oferecer cidadania a alguém tocado por tal desdita. Encarcerados nos próprios corpos, eles (e nós com eles) se tornam (de novo) vítimas do simulacro pós-moderno de um disfarçado Holocausto.
Mephisto, Jonas, Alice do País das Maravilhas, o Tarô, a Torá, os Fundos, as Peregrinações, os Médicos, os Advogados, os Professores, os Videntes, as Matrioskas, os Descaminhos, Kafka, Freud, Borges, Amós Oz – todos se misturam como ingredientes para uma tal de “torta de legumes”, capaz de nos fazer regurgitar de indignação. Porque (com muita delicadeza, sabedoria e poesia), mostram a amarração em feixe (a imobilidade!) a que estamos submetidos.
A narradora palpita ou se abstém (sem critério fixo: a vida é um sistema espúrio!); permeia e se deixa atravessar pelas outras vozes, nessa missão que é o Livro – de maneira a reconstruir a sua própria cabeça, seu próprio eixo. Em hebraico bíblico, Deus é o Nome, aquele que erige o Universo com letras e números: o Alfabeto. Pois as Linhas a serem lidas precisam do concurso de muitas letras outras, de muitos de nós – de todos! E, de preferência, da nossa excelsa liberdade para interpretá-las.
Maria Lúcia Dal Farra
Páginas | 256 |
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Data de publicação | 01/07/2021 |
Formato | 23 x 16 x 5 |
Largura | 16 |
Comprimento | 23 |
Acabamento | Brochura |
Lombada | 5 |
Altura | 0.5 |
Tipo | pbook |
Número da edição | 1 |
Classificações BISAC | ART000000; FIC027000; FIC043000; FIC044000; FIC079000; FIC130000; FIC132000; LIT003000; MED085010; SOC029000 |
Classificações THEMA | FR; FBA; FXK; FXN; JBFM; JBSF11; MNN |
Idioma | por |
Peso | 0.12 |